Uma análise acerca das ações para o combate ao tráfico de drogas no MERCOSUL e na Comunidade Andina de Nações
O argumento que desenvolvemos nesse artigo é o de que tanto o MERCOSUL como a CAN trazem elementos importantes para que seus membros possam negociar e cooperar para o provimento de bens públicos regionais. Esses elementos seriam aqueles apontados por Olson (1965) para que os membros de um grupo superem seus dilemas de ação coletiva, sendo eles: o pequeno número de participantes, a assimetria entre os membros e a existência de estruturas institucionais que viabilizem o processo de negociação e monitoramento do comportamento dos participantes.
O MERCOSUL vem, desde o final dos anos de 1990, criando estruturas formais para viabilizar a cooperação na área de segurança pública regional. O primeiro acordo (1998) previa um conjunto de ações que se fundamentavam em três pilares: 1. as atividades de fiscalização, investigação e inteligência; 2. a troca de informações e; 3. a realização de operações conjuntas das forças policiais nas fronteiras dos Estados membros (CMC/DEC.N°5/98). Entre os anos de 1999 e 2010, os membros do MERCOSUL ampliaram e reformaram o acordo relativo á segurança pública regional.
A CAN estabeleceu, em 2001, o “Plano Andino de Cooperação para a Luta contra Drogas”, cuja base era a criação de um Comitê Executivo, que nunca foi efetivado, e que previa um programa de ação baseado nos mesmos três conjuntos de ação estabelecidos no MERCOSUL. Esse plano não foi alterado ou substituído por outro, vigendo até o momento.
As ações de segurança pública desenvolvidas pelo MERCOSUL e CAN
As atividades de fiscalização, investigação e inteligência tinham como eixo central a qualificação conjunta das forças policiais. A conformação de cursos, seminários e atividades de troca de experiências demanda, por suposto, a existência de uma estrutura institucional que se responsabilizasse pela oferta dessas atividades com alguma periodicidade. Essas condições não foram criadas nem no MERCOSUL ou na CAN. No primeiro caso, os membros criaram o Centro de Coordenação de Capacitação das forças policiais- CCCP-, que não dispõem de sede própria, professores permanentes ou quaisquer outros recursos necessário a essa atividade. As atividades de capacitação ficaram restritas aquelas oferecidas pelos estados-membros. A CAN se absteve de criar essa estrutura e recorre àquela oferecida no âmbito da OEA.
No que se refere as operações policiais, os membros do MERCOSUL realizaram diversas dessas ações conjuntas, ao longo da ultima década, mas identificamos a falta de sistematização dessas operações conjuntas ao longo dos anos, bem como o relativo baixo número dessas ocorrências diante da extensa fronteira partilhada pelos membros do acordo regional. Não identificamos ações concretas por parte dos membros da CAN relativas á ações conjuntas de segurança no sentido de combater o tráfico de drogas em suas fronteiras.
Por fim, a constituição de um sistema de informação pode ser importante para aumentar a eficiência das ações de segurança. Relativamente aos outros temas da agenda, a estruturação de uma rede de informações claramente demanda menos recursos humanos e materiais dos países participantes. Mesmo assim, não identificamos ações empreendidas pelos membros da CAN nessa questão, uma vez que participar, como previa o acordo de 2001, de uma rede interamericana é bem diferente de construir uma rede composta pelos membros do acordo sub-regional. Por outro lado, o MERCOSUL constituiu o Sistema de Informações do MERCOSUL- SISME-, que ainda está em fase de estruturação.
Dessa forma, podemos considerar que há uma expressiva diferença no desenvolvimento da agenda de combate às drogas entre os dois agrupamentos regionais. A despeito de ambos proverem quantidades sub-ótimas do bem público, uma vez que a produção e comercialização das drogas ainda é uma realidade na região, o MERCOSUL tem evoluído mais que a CAN no sentido de estabelecer acordos mais adequados para viabilizar a condução da agenda, além de empreender ações mais efetivas para o combate ao tráfico de drogas.
Considerando que o MERCOSUL e a CAN têm o mesmo número de membros, as diferenças na condução da agenda podem ser atribuídas ás eventuais assimetrias entre os membros e/ou as estruturas institucionais, conforme propõe Olson como sendo os elementos determinantes para que um grupo equacione seus dilemas de ação coletiva.
Considerações finais
O argumento que pauta esse artigo é o de que a integração regional pode ser um mecanismo eficiente para prover bens públicos, uma vez que a cooperação pode ser a estratégia dominante devido ao baixo número de participantes, as assimetrias existentes entre os membros e as estruturas institucionais que configuram as relações regionais. Não há, contudo, garantias de que os acordos regionais viabilizarão o provimento em quantidades ótimas de bens públicos, uma vez que isso depende dos interesses políticos e econômicos dos membros nas diversas agendas em diferentes momentos.
Nossa principal conclusão é a de que, apesar de alguns avanços, muito há de se fazer para consolidar a agenda de segurança pública tanto no MERCOSUL quanto na CAN. As ações empreendidas até o presente momento são evidentemente insuficientes, considerando a gravidade e a urgência da questão na região. A carência de recursos humanos e materiais e a consolidação de uma estrutura institucional efetiva que possibilite a coordenação e a perenidade das ações acordadas são as principais limitações para essa agenda. É importante observar que as ações cooperativas se dão no escopo de estruturas administrativas pouco institucionalizadas como é o caso das Reuniões de Ministros do Interior do MERCOSUL e do Conselho Andino de Ministros das Relações Exteriores da CAN, que se reúnem sob os auspícios do país que exerce a presidência pro-tempore dos blocos.
Bibliografia
CENTRO DE COORDENAÇÃO DE CAPACITAÇÃO POLICIAL MERCOSUL (2013). Atividades Acadêmicas. Disponível em http://www.mercosur.int/msweb/CCCP/PT/Index.html. Acesso em nov.2011.
COMUNIDADE ANDINA DE NAÇÕES (2001). Plano Andino De Cooperacion Para La Lucha Contra Las Drogas Ilícitas Y Delitos Conexos. Disponível em http://www.comunidadandina.org/Seccion.aspx?id=59&tipo=TE&title=antidrogas. Acesso abri. 2011.
CONSELHO DO MERCADO COMUM. Decisão CMC Nº 5/98. Plano De Cooperação E Assistência Recíproca Para A Segurança Regional No Mercosul. Disponível em http://www.mercosur.int/innovaportal/v/2930/1/secretaria/decisiones_1998. Acesso em 10 abr 2012.
OLSON, Mancur (1965). A Lógica da Acción Colectiva -Benes Públicos e teoría dos grupos. Oeiras, Celta Editora, 168p.
Contato
Departamento de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), Belo Horizonte, MG, Brasil ([email protected])
Leia o artigo em: LAS CASAS, Taiane. A integração regional como mecanismo para provisão de bens públicos: uma análise comparativa da agenda de segurança pública no Mercosul e na Comunidade Andina de Nações. Rev. bras. polít. int., Brasília , v. 58, n. 1, p. 23-41, June 2015 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-73292015000100023&lng=en&nrm=iso>. access on 01 Oct. 2015. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7329201500102.
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